Ontem, véspera de natal. Como sempre reunídos na casa da minha mãe com família querida. Irmãos, sobrinhos, cunhadas, primos, primas, tios, criançada.
Música não falta. É nosso início, meio e fim. Pianistas também não faltam. Para cada música podemos escolher um que toque melhor que o outro.
Linda palavra da minha mãe, baseada em um texto deixado pelo nosso amado pastor Hélio Silva, alguns dias atrás pelo Facebook. (Vou compartilhar!)
Mais músicas, oração, agradecimento e comida. Muita comida! Destaco tudo! A farofa da minha tia Gerondina parecia pipoca viciante. O pernil do meu irmão Rogério é O PERNIL! Ninguém faz igual.
Uma turma aqui, outra ali, muitas gargalhadas, presentinhos diversos, presentões para as crianças que já estrearam imediatamente suas graças.
Aí vem a parte mais avassaladora. Minha mãe, primos, cunhada, sobrinhas e tia já estiveram por lá o dia inteiro arrumando, ajeitando, enfeitando, cozinhando, trabalhando duro. Serviço de casa. (Aquele que é eterno!)
Depois de ver minha tia ter lavado tanta louça, ali na beira da pia, sem parar, nem consegui comer minha sobremesa direito. E olha que o que mais amo é doce! Assumi.
- Deixe comigo titia! A senhora já trabalhou demais.
Ela disse que aquilo é uma diversão... tsc.. tsc...! Minha mãe diz o mesmo, algumas primas, mas eu não acredito! Limpar e lavar sem parar, nunca foi diversão de ninguém. Só de quem tem algum tipo de problema sério na cabeça.
Aí eu entro do avesso. Fui lavando, lavando, limpando, lavando mais. E não acabava nunca! Comecei por volta das 23h00. Algumas pessoas foram se despedindo de mim, eu na pia. Me beijavam, feliz natal, eu na pia.
Mais louças empilhando. Pra desocupar, secava, guardava e começava tudo novamente. Mais louça. Talheres de todos os tamanhos e jeitos. Coisas que nem sei o nome.
A casa foi ficando silenciosa. Escutei apenas a conversa suave de alguns familiares na sala escura, iluminada pelas luzes de enfeites de natal e o som do meu trabalho na cozinha. Mais louça.
Xiiiiiii! Tinha me esquecido das panelas. Panelas gigantescas! Pra quê tanto exagero?? Nem um batalhão come aquele tanto de comida. De vez em quando, um ou outro chegava e dizia, tenho um presentinho... (Cruz credo!)
Mais louça! Copos, pratinhos, talheres. Não sei de onde surgiu tanta coisa pra lavar. Fui juntando os panos de prato já molhados e colocando de "molho" na pia ao lado, porque na casa da minha mãe, tem todo um esquema montado, pra sair tudo perfeito!
Fui pegando novos panos de prato, limpinhos feito algodão, como se nunca tivessem sido usados. Lá é assim...
Sempre foi assim.
Minha mãe já tinha ido se deitar, mas antes, tinha me dito para levar comida e frutas para todos nós, com fartura.
Meu pai veio dar bom dia! O relógio marcava 3h da manhã e eu na pia.
Lembrei-me do fogão!
- Deus do céu! Minha mãe não pode ver este fogão sujo. Ela não suporta sujeira!
Fui então, do meu jeito desastrado, limpar o fogão. E pra encaixar as peças depois??? Não fui preparada para isto. Tive que chamar os especialistas em montar e desmontar coisinhas. Meu sobrinho Olavo, de 2 anos, faria isto com maestria. Eu não consigo!
Foi me dando um misto de desespero, cansaço, vontade de chorar, ou de rir muito, que comecei a achar que estava delirando.
O chão estava um caos!
Lá do corredor, muito longe, minha mãe avistaria a marca de uma uva amassada. Mais desespero. O chão. O chão precisa ser limpo.
Tirei as cadeiras todas. Varri, limpei, limpei, limpei. Tentei..., tentei...
Mais louças! Voltei para a pia. Por fim, achei uma panela imensa onde o Rogério tinha feito um risoto de bacalhau. Pronto! Meu castigo estava completo. Perguntei a mim mesma o que tinha feito de tão grave para merecer aquilo? Eu detesto qualquer tipo de peixe, ou frutos do mar. O cheiro me dá náuseas. E eu fui lavar aquela panela, resignada, dizendo ao meu irmão bem baixinho, que, certamente já dormia em paz na sua casa:
- seu canalha! Estragou o meu natal com este bacalhau. Que cheiro horrível! Bacalhau não rima com natal! Que idéia de jirico.
Achei que tinha terminado. Não, não. Tinha a mesa de frutas, nozes, avelãs, chocolates, panetones. Que mesa linda e bem arrumada pra ser desarrumada depois.
"Isto eu chamo de correria atrás do vento."
Eu juro que fiz o meu melhor. Desinfetei, relimpei, juntei mais louças, guardei tudo no lugar que sabia que estava certo, pois todas as peças na casa da minha mãe se encaixam. Pra todas as coisas tem um lugar. Da panelona grande, a comida vai pra panela menor, depois pra uma vasilha média, pequena, minúscula, até a comida acabar. Tudo é milimetricamente organizado. Como ela consegue?
Ok! Cheguei aonde queria. Minha irmã era perfeccionista.
Vocês não entenderam!! Ela era PER-FEC-CIO-NIS-TA! Do tipo maluca de pedra. Roupas guardadas por cor, tamanho, livros, cd's, fitinhas k7, caixas, perfumes, utensílios, canetas, agulhas. Sim. As agulhas eram organizadas. Nós vivemos juntas até eu completar uns 16 anos, quando tivemos um violento "litigioso", porque eu joguei meus tênis ao chegar do colégio, na linha "imaginária" que pertencia a ela no quarto. Metade dela. Metade minha.
Metade céu, metade inferno!
Senti falta dela. Chorei muito, não queria que ela saísse do quarto, tinha medo de dormir sozinha, mas ela não me suportou.
Reconheço! Eu sou muito desorganizada. Mas eu sou limpinha!!! Só que isto não é o suficiente. Não pra mim. Nunca foi até o dia que antecedeu a partida dela.
Em confissão de irmãs, ela disse-me que eu era sim muito desorganizada, bagunceira, esculhambada, mas que podia contar comigo em qualquer instante da sua vida e, como aconteceu, até o momento em que partiu.
Nós éramos assim. Ela sol, eu lua. Ela tempo aberto, eu tempestade. Mas nós nos completávamos com uma perfeição que só Deus mesmo explica.
Mamãe tentou me fazer uma menina-mulher prendada. Tentou me ensinar a organizar com perfeição, costurar, cozinhar, coisas que ela já nasceu fazendo...
Eu não consegui aprender. Talvez eu não quis aprender. Afinal a Claudinha já era tão perfeita.
Mas minha mãe nunca foi de me cobrar absolutamente nada. Aliás, esta estória termina muito bem. Porque recebi um telefonema dela há pouco, dizendo-me que amou minha "arrumação".
Interessante que eu estava apavorada ontem com a aprovação dela sobre o que eu estava fazendo. E as lembranças de outrora voltaram fortes. Meu sobrinho me abraçou enquanto eu lavava a eternidade de louças e eu olhei exatamente para a rua onde passei toda minha infância e adolescência e disse:
- Bruninho, eu só queria andar de patins!!!
Quando eu era menina, que era meu dia de lavar a louça, eu não conseguia. E chorava porque não fazia direito e não estava andando de patins... (eu tentava lavar a louça com os patins nos pés!)
Assim é a nossa vida. Como pode aquela pequena gigante da minha mãe, conseguir deixar organizada uma casa tão imensa? Tudo no seu lugar? Isto é um dom.
Como pôde minha irmã deixar as suas coisas em perfeita ordem, até a hora de ir?
Como podem estas mulheres incríveis que fazem de suas casas, verdadeiras obras de arte, porque serviço de casa é coisa pra artista e pra gente muito forte!
Vou morrer sem entender.
Talvez morra sem aprender.
Honestamente não faço muita questão. Minha cabeça pensa demais em outras coisas e a louça me atrapalha a concentração.
Finalmente, devo dizer que sou fã incondicional de vocês. Em especial da minha mãe e da minha irmã. Mas não quero ser como vocês não.
Higiene sempre! Organização..., bem..., cada um que cuide do seu pedaço! Deixem o meu em paz...
Só me digam, por favor, onde está mesmo meu controle remoto e meu celular?
Gláucia Carvalho
25.12.2013
(Dedico à minha mãe e minha irmã. As mulheres mais organizadas, limpas e perfeitas que já conheci na vida!)